2007-02-09

Feira

Sexta feira é dia de mercado aqui, no bairro. Ao fundo da minha avenida, mesmo junto ao stand de carros ultra-luxuosos, o arraial é montado, sem cerimónias, obrigando os condutores a realizar percursos alternativos..
Bancas e bancas de frutas, hortaliças, flores, peixe, carne; de pasteis (petisco obrigatório em S. Paulo), de doces; de todos os condimentos que outrora se compravam a peso de ouro com risco de vidas, trazidos nos dorsos dos camelos que enfrentavam os quarenta ladrões, e tudo e tudo!
Gosto de ir à feira, acompanhada de Analice...no principio, tímida e respeitosa, colocava-se dois passos atrás de mim, obrigando-me a parar e chamar por ela, fingindo não perceber a tradição da desigualdade; com o tempo, é ela quem me arrasta quando eu paro, paralizada pelo cheiro intenso das frutas tropicais, a curiosidade imensa que me assalta perante os legumes mais estranhos, a solicitação dos feirantes e dos pedintes, sempre os mesmos...Analice adora exibir-me às outras empregadas do condomínio que por ali cumprem as tarefas obrigatórias (madama que é madama não se mistura assim) e quando está bem disposta, diz que sou uma "benção"...
Logo depois das bananas e mesmo antes do peixe, senta-se num banquinho baixo, um individuo com deficiência motora, de sorriso fácil e cabelos encaracolados que espera a minha oferta de forma atenta e que, no fim, me deseja um dia feliz..temos uma relação engraçada, nem eu faço um favor, nem ele recebe o dinheiro como tal..Erika, despenteada, de expressão cansada e dura não obstante a sua tão tenra idade, limita-se a estender a mão, olhos perdidos no vazio..o velhote que quase nao fala, apenas resmunga, persegue-me pelo terreno, quantas vezes ele considerar necessárias apesar de Analice "o botar pra correr.."..De todos, o que me deixa com o coração mais despedaçado é um homem de quem por norma se foge porque tem o hábito da agressão: alto, negro, era uma vez atlético, quase nu, envolto nos trapos mais nojentos que algum dia vi, cabelo e barbas duras da sujidade acumulada , olhos loucos..hoje comprei-lhe um pastel, sentou-se mudo no passeio, comendo devagar, como um gourmet experimentado..
À medida que percorremos a feira delicio-me com os pregões, cheios de imaginação, cantados ou gritados na hora, fariam uma varina repensar a vida! Mas o melhor, o melhor de tudo, é o bom dia de todos, a oferta generosa dos produtos, a boca ligeira e bonita: "uma flor carregando flores.."; "olha a pêra portuguesa que vem lá do sítio onde tu nasceu.."
Um abraço

2 Comentários:

Anonymous Anónimo disse...

Vivo lá tão perto, e nunca lá fui...

sexta-feira, fevereiro 09, 2007  
Blogger alexmanuela disse...

Mas devias..ias gostar! Bjos para ti

sexta-feira, fevereiro 09, 2007  

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